quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

A arquitetura como representação da montanha sagrada - Final.

" Não existe lugar nos altiplanos peruanos que seja melhor defendido por baluartes naturais(...) Para impedir que os inimigos ou visitantes não desejados alcançassem seus santuários e templos, confiaram primeiro nas correntezas do rio Urubamba, que são perigosas mesmo na época de seca e absolutamente intransponíveis durante pelo menos seis meses do ano. Pelos três lados, essa era a sua linha de defesa. Pelo quarto lado, o maciço de Machu Pichu é acessível apenas desde a chapada das alturas e somente por uma trilha estreita como um fio de navalha, flanqueada por precipícios".
Dr. Hiram Bingham, descobridor do sítio arqueológico inca em 1911. 1
            A arquitetura  religiosa  das civilizações ocidentais também ilustra a  necessidade destes povos  entrarem em harmonia com o Cósmico através da verticalidade. Não apenas no sentido emocional mas, a análise de diversos edificios erigidos ao longo das Américas,  tem seu paralelo no sistema estrutural de edificações piramidais mais simples construidas no Oriente - como os zigurates mesopotâmicos -, mostrando a ligação entre as tecnologias, e vocabulário arquitetônico utilizado entre diversos povos.
Pirâmide Maia.
Fonte: arquiteturamaia.blogspot.com
            Os templos maias, anteriores a 800 d.C., foram edificados com 9 plataformas recuadas sobre base quadrada, fabricadas com terra e cascalho em aterro (na maioria rocha sólida). Assim como na civilização mesopotâmica, os rituais também eram realizados na parte mais alta da edificação, cujo acesso se dava por escadaria externa.
            As pirâmides astecas de Teotihuacan, no México, configuram-se como as pirâmides maias, porém possuem um projeto de implantação bastante organizado, à maneira como os egípcios implantavam suas pirâmides. As bases dos edifícios preservados são quadradas ou retangulares, mostrando que não estavam preocupados quanto a forma da base, mas sim com o contato com o Cósmico por intermédio da verticalidade – a montanha simbólica. Embora a relação entre estas construções e a dos egípcios seja especulada como datadas do mesmo período (cerca de 2600 a.C.), a hipótese mais certa é de terem sido construídas a partir de 800 d.C. 2.
Complexo de pirâmides em Teotihuacan, México. Ilustração.
Fonte: mexicohoy.com
Complexo de pirâmides em Teotihuacan.
Fonte: viajehoy.blogspot.com
            A última civilização ocidental cuja arquitetura religiosa possui aspectos semelhantes às construções piramidais é a Inca. No entanto, a importância da montanha na conexão com o Divino foi utilizada na forma literal, segregando duas montanhas para a edificação de todo um complexo religioso: Macchu Picchu e Wayna Picchu, a montanha jovem e a montanha velha. Na realidade, as edificações principais estão em Macchu Picchu, sendo implantadas em sua maioria na parte mais plana da montanha, deixando os pontos mais acidentados para as "terrazas" onde se cultivavam os alimentos consumidos pelos moradores do lugar. Porém em Wayna Picchu é possivel  identificar edificações escalonadas,  sendo uma delas inclusive chamada de pirâmide inca. Mesmo assim, acredito que a análise no que se refere ao tema "montanha sagrada", para o caso da civilização inca, está mais na apropriação de um monte do que na tentativa de reprodução do mesmo.
Macchu Picchu e Wayna Picchu.
Foto do acervo particular.
            Após um longo tempo sem novas arquiteturas piramidais, no período que vai de 700 a 1.200 d.C., aparecem novos edifícios com esta tipologia no Oriente. Os países budistas passam a construir seus templos com uma nova volumetria, muito semelhante às pirâmides e zigurates: os pagodes. Originários da Mongólia, os templos inicialmente construídos com pedra e tijolos, passam a ser edificados com complexos sistemas de madeira, sendo o programa de necessidades dividido entre os vários pavimentos do prédio. O uso da edificação se dá na parte interna e os forros são ricamente decorados para forçarem o praticante a olharem para a direção do céu. Já na parte externa, marcos verticais são colocados na cumeeira do telhado, sinalizando o papel religioso do edifício para a sociedade.

Pagode Mongol.
Fonte: http://danny.oz.au/
            Com o advento de religiões como o Cristianismo, a tentativa de se estabelecer um contato com Deus recriando-se a montanha a partir do volume do edifício é abandonada. Posteriormente, essa volumetria tão especifica, que aponta para o alto, volta a ser utilizada na arquitetura ocidental contemporânea, porém com um novo discurso sobre o Sagrado.

Fonte:

2. ELLIS, Ralph. Thoth, o arquiteto do Universo: mapas neolíticos da Terra./
tradução de Flávio Lubisco – Rio de Janeiro: Madras Editora Ltda, 2006. c.VIII.

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