terça-feira, 12 de agosto de 2014

A influência das ordens secretas no plano urbano da cidade de Paraty.

“ A relação entre a Maçonaria e a sociedade em geral sempre foi dúbia. 
Por um lado, as boas obras e as significativas contribuições dos maçons foram largamente aplaudidas; 
por outro, o segredo que envolve a Ordem foi objeto de incompreensão, suspeita e temor.”
W. Kirk MacNulty  1


         Atualmente, a Maçonaria se justifica por sua vocação filantrópica fundamentada em princípios  filosóficos - 2.  Apesar de não possuir definição político ou religiosa, historicamente a Ordem sempre se manifestou no campo ideológico, o que ocasionava certa alternância em aliados do poder ou inimigos destes. Perseguidos na Europa começaram a chegar ao Brasil no século XVIII, durante o ciclo do ouro, muitos se estabelecendo na cidade de Paraty, que na época era o ponto intermediário entre a capital e as minas.

Vista de rua em Paraty - RJ. Decoração simbólica nas fachadas.
Fonte: www.google.com.br

         O Porto Principal de Paraty , atual Cais,   foi construído em 1722, mesmo período emq eu a Vila recebeu uma trincheira para protegê-la , hoje a Praça da Bandeira.  Todas essas obras foram realizadas devido ao aumento no fluxo comercial ocasionado pelo escoamento do ouro, gerando uma melhora na economia na cidade,  permitindo o empenho para novas construções e benfeitorias não só relativas à segurança, mas também relacionadas ao transporte. Com relação ás edificações residenciais  a  Vila de Paraty tornava-se promissora,  ostentando 400 casas construídas com paredes de pedra e cal ou na técnica de pau-a-pique, sendo que dentre todas essas casas, 40 eram grandes sobrados. As casas comerciais somavam um total de 60 estabelecimentos que comercializavam principalmente aguardente, secos e molhados, e outras mercadorias trazidas de Minas Gerais, região de São Paulo e até mesmo da Europa. Todo esse fluxo comercial justificou o título de segundo porto da Colônia Portuguesa, no ano de 1750.  3

Mapa do centro histórico de Paraty - RJ.
Fonte: www.google.com

         Com o progresso econômico a Maçonaria buscou demarcar a Vila de Paraty com sinais característicos de sua simbologia tendo em vista fazer-se reconhecer frente aos outros afiliados vindo de todos os lugares – 4 – e a  influência da ordem pode ser notada em vários detalhes da arquitetura da cidade até hoje.  Nessa época, a cidade já possuia um “arruador”    5,  que chamava-se Antônio Fernandes da Silva.  Embora o mesmo justificou esse traçado para evitar o vento encanado nas casas e distribuir equitativamente o sol nas residências, tal desenho contribuiu para a criação de três cunhais de pedra nas casas das esquinas,  formando um triângulo imaginário que, decorados com figuras geometrias e intrincados esquemas compositivos que geram desenhos complexos, contribuiu de forma positiva para “marcar” a presença dos maçons da cidade.  6.   Outra contribuição do arruador foi o plano urbano do centro de Paraty  construído com 33 quarteirões. Mesmo as plantas das casas foram feitas na escala 1:33.   7

           Sobre a decoração das fachadas das casas, especula-se que a cor azul-hortência presente nas janelas e portas tenha alguma relação com a Ordem Maçônica , a exemplo da cidade portuguesa de  Óbidos,  cuja ordem também teve importante influencia.  Outra questão apresentada como especulativa é o fato do primeiro padroeiro da cidade ser São Tiago de Compostela, santo cuja história se aproxima da mística da ordem.   8

Decoração dos "cunhais" das casas de Paraty.
Fonte: www.google.com.br

           Em uma cidade com arquitetura tão interessante como Paraty, a beleza da decoração arquitetônica facilita que o espectador se perca tentando decifrar estes intrincados códigos. Além disso, as lacunas dos documentos históricos impedem uma definição sobre os interesses que existiam ao se planejar esta vila tão importante do ponto de vista econômico e político no século XVIII. Independente de qualquer documento, podemos ainda barrar no sigilo da Maçonaria, ordem que prima pelo segredo. O labirinto é enorme, e este artigo assim como outros escritos sobre a cidade ou sobre a Maçonaria quer apenas revelar a importância e Paraty ou mesmo da ordem, eliminando qualquer preconceito no intuito de valorizar o trabalho dos “irmãos pedreiros” e sua parcela de importância no progresso da humanidade.

           “A Maçonaria oculta os seus segredos de todos, à exceção dos seus seguidores e sábios, ou os Eleitos, e utiliza falsas explicações e falsas interpretações dos seus símbolos para induzir a erro aqueles que merecem ser induzidos em erro; para ocultar a Verdade destes e para a manter afastada dos mesmos.”  General Albert Pike.


1 – MACNULTY, W. Kirk. A Maçonaria: símbolos, segredos , significado. 
Editora Martins Fontes, São Paulo, 2012. P 216.

2 - Até o final dos anos de 1600 os maçons ditos “operativos” tiravam seu sustento da arte de construir. 
Depois desta data as características do ofício começaram a mudar e até a metade do século XVIII 
as Lojas perderam o interesse pelo comércio e passaram a exercer atividades 
de cunho social e beneficente, abrindo espaço para cavalheiros e negociantes sem nenhum contato 
com a “Arte de Construir” – antigo ofício de pedreiro –, que consolidaram os ensinamentos e princípios especulativos da Maçonaria Moderna. 
CARR, Harry. O Ofício do Maçom. Editora Madras. São Paulo, 2007


4 – Em 1833 fundaram na cidade a Loja Maçônica “União e Beleza”
 (na esquina da rua do Comércio com a rua da Cadeia), certamente os mais responsáveis pela
 influencia da ordem na  arquitetura da cidade. 
Um dos fundadores desta loja maçônica foi o vereador José Campos do Amaral, 
que convenceu a Câmara a formular neste ano  o código de postura e obras de Paraty, 
obedecendo alguns critérios maçons. Graças a esse código e ao isolamento geográfico ocorrido entre 1870 e 1950 a cidade manteve preservadas suas características arquitetônicas.
 Quando do fechamento da Loja União e Beleza alguns móveis com símbolos maçons foram doados à Câmara dos Vereadores, onde se encontram até hoje.

5 – No período colonial o arruador era  a pessoa encarregada de
 organizar as construções das ruas, das casas, das praças planejando o traçado das cidades.

6 – Diferente do que acontecia na Europa em que os símbolos maçons tinham que ser discreto 
por causa das frequentes perseguições, o mesmo não acontecia em Paraty onde os 
sobrados cujos proprietários eram maçons possuíam faixas repletas de desenhos geométricos de linguagem Maçônica, preservados até hoje no centro histórico da cidade. 
Em alguns casos, através dessa simbologia, o iniciado poderia até saber o grau do maçom de cada residência.

7 –  O 33 é um número de elevada importância para a Maçonaria que, segundo a interpretação ortodoxa da Bíblia, 
seria a duração em anos da vida de Cristo. 
Derivando desse número, o triângulo isósceles é o símbolo maçom por excelência, presente em toda a representação da ordem seja na decoração de seus edifícios ou mesmo em publicações de seu editorial.


8 – Tais informações não foram encontradas em livros acadêmicos. 

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