terça-feira, 24 de maio de 2011

Arquitetura livre e subjetiva do Homem Moderno

“Sendo esta época tão fértil em descobertas,
                                                               tão abundante em força vital, não há nada melhor em arte
                                               para transmitir à posteridade além de imitações...”

Eugène Emmanuel Viollet-le-Duc, 1879. 1



            O período que vai do final do século XVIII até as primeiras décadas do século XIX denominou-se “transição moderna”. O mundo ocidental passou por revoluções que transformaram inteiramente a vida e a condição humana. A revolução da Independência dos Estados Unidos, a Revolução Francesa e a Revolução Industrial, estabeleceram uma nova ordem social, econômica e política que acabou com as instituições absolutistas -  monarquia, Igreja e vida agrária -  o chamado Antigo Regime, e apresentou o novo Estado liberal com seu modo de produção capitalista. Os novos tempos repercutiram intensamente na arquitetura definindo novas formas de pensar e criar espaços A sociedade burguesa,  nova clientela, ganhou autonomia.
            O arquiteto do iluminismo passou a administrar seu ofício com maior envolvimento pessoal, desprendendo a arquitetura do vínculo para exigências de representação dos modelos religioso ou moral. A arte que compreende fins do século XVIII até século XIX, se liga a duas concepções de mundo e de vida conhecidas como o Neoclássico e o Romântico. Profundamente influenciados pelo contexto cultural do Iluminismo europeu, os arquitetos do século XVIII passaram a rejeitar a religiosidade intensa da estética anterior e o exagero luxuriante do barroco. Buscava-se uma síntese espacial e formal mais racional e objetiva, mas ainda não se tinha uma idéia clara de como aplicar as novas tecnologias em uma nova arquitetura. Inseridos no contexto do neoclassicismo nas artes, aqueles arquitetos viram no período clássico, a arquitetura ideal para os novos tempos, adotando a arte greco-romana como modelo de equilíbrio, proporção, clareza. O “gênio” romântico se apresentou com criatividade artística: a criatividade artística romântica tinha sua fonte no inconsciente, na imaginação, no sentimento e na vontade. O neoclassicismo e o romantismo tentavam dar resposta aos problemas de uma existência humana que procurou encontrar o seu significado num mundo já dilacerado ou tensionado entre natureza e ciência, indivíduo e coletividade. 2
            O neoclassicismo surgiu sob influência do iluminismo e marcou um gosto por formas clássicas e severas, paredes lisas, com mínima decoração. A organização do espaço era geométrica, com detalhes gregos ou romanos. As obras, monumentais, não mais igrejas, mas palácios cercados por imensos parques e áreas verdes de desenho refinado. O romantismo favoreceu o ressurgimento não de uma única tipologia mas potencialmente de um ilimitado número de tipologias. De fato a redescoberta e a utilização de formas previamente negligenciadas ou rejeitadas, incluindo as destinadas aos espaços religiosos,  tornaram-se um princípio estilístico: o “estilo” do romantismo na arquitetura. 3  Nessa arquitetura, diferente da arte clássica renascentista, não se pretendia elaborar um estilo novo. Ela era no entanto muito mais uma cópia do repertório formal clássico do que uma experimentação desta forma, tendo como diferença a aplicação das novas tecnologias. A Europa assistia a um grande avanço tecnológico, resultado direto dos primeiros momentos da Revolução Industrial e da cultura iluminista. Foram descobertas novas possibilidades construtivas e estruturais, de forma que os antigos materiais como a pedra e a madeira passaram a ser substituídos gradativamente pelo concreto e  pelo  metal.
            Em 1775, quando o historiador de arte alemão Johann Wickelmann  4  publicou um famoso tratado pregando a imitação da “simplicidade nobre e grandeza calma” dos gregos, Jacques Germain Soufflot projetou o primeiro grande monumento do novo estilo em Paris, o Panteão, construído como uma igreja mas secularizado durante a Revolução. Paredes lisas e pouco decoradas são sóbrias em contraponto ao imenso pórtico modelado sob influência dos antigos templos romanos. O que diferenciava esse Neoclassicismo do Clássico anterior era menos a sua aparência externa e mais sua motivação. A partir do resgate do vocabulário grego, outros exemplos seguiram-se na Inglaterra e América tanto para residências quanto para edifícios ligados a outras instituições que não as religiosas.

Panteão em Paris, projeto de Jacques Germain Soufflot
fonte: jornallivre.com.br
 Notas: 

1. STRICKLAND, Carol. Arquitetura comentada. RJ. Ediouro. 2003. p. 96.

2. ARGAN, Giulio Carlo. El Arte Moderno. Madri, Espanha.  Akal Ediciones. 1998. c. 1 e passim.

3. JANSON, H.W. Iniciação a História da Arte. SP. Editora Martins Fontes. 1996. p.309.

4. Johann Wickelmann, bibliotecário e historiador da arte germânico. O trabalho como bibliotecário do conde Heinrich von Bünau, permitiu-lhe as primeiras pesquisas sobre arte clássica, ao mesmo tempo que estudava o grego. Em Roma, se tornou bibliotecário do Vaticano, inspetor geral de antiguidades do cardeal Alessandro Albani, dono de uma das maiores coleções particulares de arte clássica. Seu primeiro livro Gedanken über die Nachahmung der griechischen Werke in der Malerei und Bildhauerkunst (1755), analisou o ideal da arte grega e propôs sua imitação como única possibilidade de uma arte digna. No segundo Geschichte der Kunst des Altertums (1764), defendia a superioridade da arte grega.

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