quinta-feira, 14 de agosto de 2014

Questão religiosa brasileira: a crise entre a Igreja Católica e as Ordens secretas no séc. XIX

“Até 1872, a Maçonaria no Brasil respeitou a religião católica. 
Introduziu-se no clero, nos conventos, nos cabidos, nas confrarias. 
Mas quando teve um Grão-Mestre à frente do Governo nacional, julgou oportuno atacar a Igreja”

Antônio Carlos Villaça. 1

         Historicamente a presença da Maçonaria no Brasil não despertou nenhuma oposição durante muitos anos, encontrando nesta terra terreno fértil para criar raízes e estabelecer importantes parcerias com objetivos políticos ou mesmo sociais. Diferente da regra canônica que imperava em outros países – cuja bula Papal condenava quem se associasse à Ordem –, a  força da Ordem impulsionava posições de destaque inclusive em importantes cidades como por exemplo no Rio de Janeiro, capital brasileira na época.  2 .

Foto de D. Vital como frei capuchinho.
Fonte: www.google.com

        A tensão entre a Igreja Católica e a Ordem dos irmãos pedreiros teve como cenário a cidade de Olinda, e como principal personagem Dom Vital   3 , nomeado Bispo aos 27 anos.  Em março de 1872, houve uma festa da Maçonaria que comemorava a Lei do Ventre Livre,  4   obtida pelo então principal Ministro do Imperador, Presidente do Conselho  o Visconde de Rio Branco. Consta que um dos oradores da festa foi inclusive um padre, chamado Almeida Martins. O bispo do Rio de Janeiro, D. Pedro Maria de Lacerda, surpreso com tal atitude, chamou o padre em particular para ponderar-lhe que ele não podia ser padre e maçom ao mesmo tempo. O padre recusou atender a qualquer ponderação e o bispo suspendeu-o de ordens. A Maçonaria considerou-se atingida com tal ato e em assembleia, decidiram iniciar uma campanha coletando fundos e criando publicações para divulgar os interesses da Ordem em todas as capitais do país.  

          Assim, quando D. Vital chegou ao Recife, já encontrou  os jornais maçons  em circulação, divulgando também determinados eventos realizados inclusive nos edifícios das próprias igrejas católicas. Primeiro anunciaram que iria haver uma missa em ação de graças numa loja. Diante da proibição sigilosa do bispo, nenhum padre ousou celebrá-la. Depois, pediram missas por maçons falecidos e mais uma vez houve a recusa dos padres. Por fim o jornal "A Verdade" publicou uma série de artigos entendidos como ofensas pelas diretrizes católicas da época, e em resposta,  o bispo D. Vital publicou  um protesto contra estes textos específicos, motivando a população a protestar também, e  reforçando ainda tais posições  em um sermão público na catedral da cidade. À revelia, dias depois o jornal “A Verdade”, publicou lista de padres e cônegos, presidentes, secretários e tesoureiros de irmandades que também pertenciam às lojas, e o bispo chamando-os um por um, em particular, exigiu retração publica e o desligamento das lojas.  

Foto do Visconde do Rio Branco.
Fonte: www.google.com

        Enquanto uma onda de insegurança reinava em Olinda, também o bispo de Belém do Pará, D. Antônio Macedo Costa, resolveu combater  a Maçonaria. As notícias a respeito, chegaram ao Rio de Janeiro, e provocaram no Governo uma resposta aos dirigentes da Igreja Católica. Depois de inúmeras trocas de cartas envolvendo desde o Imperador até o Papa da época, o Governo mandou processar e prender D. Vital trazendo-o ao Rio de Janeiro para ser julgado pelo Supremo Tribunal. D. Vital foi condenado a 4 anos de prisão com trabalhos forçados, mesma punição do bispo de Belém. Mesmo preso, D. Vital escreveu e mandou publicar uma carta, "A Maçonaria e os Jesuítas", com 139 páginas, em que defendia a estes e atacava a Ordem.    Por razões políticas, caiu o gabinete do Visconde do Rio Branco e o Duque de Caxias foi chamado para sucedê-lo, concedendo anistia aos bispos.

      Os ânimos se acalmaram e a convivência, ao menos em território nacional se manteve pacífica. Contudo, a posição da Igreja Católica permaneceu igual, enumerando os princípios considerados incompatíveis com a Doutrina Católica Romana.  6    Em todos os estudos realizados com base acadêmica, em nenhum momento notam-se  sentimentos anticlericais, anti-Igreja ou anticristãos por parte dos membros da Ordem. Contudo, o desgaste ocasionado por conflitos históricos em disputas de poder geraram “ranços” que criam preconceitos contra essa ou outras Ordens Secretas. O cenário do século XXI dissocia a Religião, a Ciência e a Magia, criando barreiras intransponíveis mesmo em um território pacifico como o brasileiro. No momento de pluralidade religiosa, outras correntes se tornam mais ameaçadoras e ao menos por enquanto, o simbolismo das Ordens Secretas pode ser admirado e estudado com maior tranquilidade.
  
  
1 – VILAÇA, Antonio Carlos. História da Questão Religiosa no Brasil. 
Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1974. P. 7.

2 – Visconde do Rio Branco, José Maria da Silva Paranhos 
(* 16 .03. 1819 Salvador BA. + 0.111.1880, RJ). Seu pai era o português e tio coronel de
 engenheiros foi estudar no Rio de Janeiro onde ingressou no curso de Engenharia na Escola Militar. 
Afiliou-se membro da Maçonaria por volta de 1840, chegando a publicar um folheto a respeito da "Constituição Maçônica". 
Importante político da época, tornou-se Grão-Mestre da Loja da rua do Lavradio,  
cooperando com a publicação de vários jornais anticlericais editados pela maçonaria, 
entre eles no Rio, o jornal A Família; em São Paulo, o Correio Paulistano; 
em Porto Alegre, O Maçom; no Pará, o Pelicano; no Ceará, A Fraternidade; 
no Rio Grande do Norte, A Luz; em Alagoas, 
O Labarum e em Recife, dois, A Família Universal e A Verdade. 
Foi um dos ministérios mais duradouros do período imperial, com participação 
de políticos de ambos os partidos. Coube a Paranhos sancionar a Lei do Ventre Livre 
(28 de setembro de 1871) e enfrentar a questão epíscopo-maçônica nos anos de 1873/1874. 

3 - D. Frei Vital Maria Gonçalves de Oliveira (* 27.11.1844 PE, + 1878, Paris.FR)  
com nome civil foi Antônio Júnior. Estudou no Seminário de Olinda, 
e depois em S. Sulpice em Paris, se tornando capuchinho. 
Posteriormente passou por outros dois seminários europeus antes de retornar ao Brasil, 
em 1868, vindo a integrar o corpo docente no Convento dos franciscanos em São Paulo. 
Em março de 1872 foi sagrado bispo por indicação do Governo do Império do Brasil, 
e nomeado bispo de Olinda e Recife e tomou posse de seu cargo em 24 de Maio de 1872. 
D. Vital,  morrreu aos 33 anos de idade, em Paris. Seu corpo foi enterrado na cripta dos 
franciscanos em Versalhes, de onde, mais tarde, foi trasladado para o Recife. 
Está enterrado na Basílica de N. Sra. da Penha, em Recife. 
OLIOVOLA O.F.M, Frei Feliz de. D. Vital -- Um Grande Brasileiro.
 Edição da Imprensa Universitária, Recife, 1967.

4 - A Lei do Ventre Livre, também conhecida como “Lei Rio Branco” foi uma 
lei abolicionista, promulgada em 28 de setembro de 1871 (assinada pela Princesa Isabel). 
Esta lei considerava livre todos os filhos de mulher escravas nascidos a partir da data da lei.
 Tinha por objetivo principal possibilitar a transição, lenta e gradual, no Brasil do
 sistema de escravidão para o de mão-de-obra livre. Vale lembrar que o Brasil, 
desde meados do século XIX, vinha sofrendo fortes pressões da Inglaterra para abolir a escravidão. 
  Junto com a Lei dos Sexagenários, A Lei do Ventre Livre (1887), 
a Lei do ventre Livre serviu também para dar uma resposta, embora fraca, 
aos anseios do movimento abolicionista.

 5 – Voce pode acessar o livro através deste link:

6 - O último documento da Igreja sobre o assunto foi produzido pela Sagrada 
Congregação para a Doutrina da Fé, em 26/11/1983, e assinado pelo 
Cardeal Joseph Ratizinger, que os maçons consideram como seu inimigo figadal.  
A Declaração afirma: “Permanece imutável o parecer negativo da Igreja a respeito
 das associações maçônicas, pois os seus princípios foram sempre considerados
 inconciliáveis com a doutrina da Igreja, e por isso permanece proibida a inscrição nelas. 
  Os fiéis que pertencem às associações maçônicas, pois os seus princípios foram sempre 
considerados inconciliáveis com a doutrina da Igreja, e por isso permanece proibida a inscrição nelas.  
Os fiéis que pertencem às associações maçônicas estão em estado de pecado grave, e não podem aproximar-se da Sagrada Comunhão”. http://www.presbiteros.com.br/site/maconaria-um-pouco-de-historia/



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