“O arquiteto cristão, não contente em construir florestas, quis, por assim dizer,
construir seus murmúrios, e, por meio do órgão e do bronze suspenso, prendeu ao
templo gótico ate o ruído dos ventos e dos trovões que rolam nas profundezas
dos bosques. Os séculos evocados por esses ruídos religiosos faz com que
suas antigas vozes saiam do seio das pedras e suspirem em todos
os cantos da vasta basílica.”
Chateaubriand, Le génie du christianisme, Paris, 1802, III, c.VIII. 1
Na Idade Média, semelhante ao período primitivo, a necessidade de proteção (contra os bárbaros) e a verticalidade (ligação do homem com o Divino) permearam a arquitetura. Nos edifícios ligados a religião da época (igrejas cristãs), a estrutura física adotada decorreu da necessidade de grandes vãos internos para se adequar às novas atividades: festas religiosas ou não. Por este motivo, as colunas continuaram a ser utilizadas – agora unidas por arcos – e conseqüentemente a base para a planta destes edifícios era o quadrado. Quando transposto do eixo horizontal para o eixo vertical a fim de orientar as alturas do prédio de forma harmoniosa, o quadrado se transformava na figura do cubo.
O Cristianismo cresce e por intermédio do Catolicismo, grupos formados darão sua contribuição no que diz respeito ao uso do círculo na arquitetura sagrada, já que o uso do quadrado e do cubo, conforme dito acima, se faziam também por uma necessidade estrutural. O primeiro grupo é chamado de Cavaleiros Templários, constituído no ano de 1118 em Jerusalém, com a função de prover a segurança aos peregrinos que visitavam os santuários sagrados na Terra Santa recém conquistada. Seu poder cresceu rapidamente e logo a organização se tornou rica, capaz de edificar várias igrejas cristãs. O círculo tornou-se a marca dos templários bem como outros símbolos obtidos através do intercâmbio com religiões e culturas orientais. A forma circular adotada para a planta dessas igrejas foi declarada posteriormente como heresia pela Igreja Católica Romana, que percebia que os templos pagãos primitivos estavam sendo usados como referência para essas obras. A ordem foi extinta em 1314, porém a riqueza acumulada possibilitou à revelia, a construção de outras igrejas redondas na Inglaterra. 2
Igreja de São Tomás, sec. XII. Limine, França. Fonte: acervo particular. |
Os cavaleiros Templários e os Maçons, em contato com as mesmas civilizações orientais, adquiriram novas maneiras projetuais elaboradas a partir do quadrado. Os dois sistemas maçônicos de geometria eram o ad quadratum e o ad triangulum, sendo o primeiro o mais usado. O ad quadratum é uma seqüência de quadrados desenhados no ângulo de 45º um ao lado do outro, cujos centros coincidiam entre si. Esse esquema pode ser identificado através do cruzamento dos arcos nas naves das igrejas góticas. Dessa técnica, surgiu o dodecaid: três quadrados posicionados no mesmo ângulo de 45º, sobrepostos em um quadrado triplo simbolizando a Santíssima Trindade cristã. Era a partir destes esquemas geométricos originados sob a forma de composições quadradas, que a Maçonaria estabelecia seus segredos, e através dos projetos de igrejas deixava suas marcas: “Se queres projetar um pináculo seguindo a tradição dos canteiros, e deseja que seja geometricamente correto, começa com o quadrado”, recomendaria determinado autor de um livro intitulado “Sobre os pináculos”. 4
Igreja de S. Pedro e S. Paulo, sec. XII. Rosheim. França. Fonte: acervo particular. |
Sabe-se que a complexa visão do mundo, cuja ênfase estava na harmonia entre o Microcosmo e o Macrocosmo já era vigente na Idade Média. O cubo e o quadrado nos tempos dos carolíngios aproximadamente no ano 800, foram as formas escolhidas para retratar a criação divina nas artes, cujas justificativas se apoiavam nas obras de Isidoro de Sevilha 5, que desenvolveu seus estudos em contato com a cultura árabe, onde conheceu os conceitos estabelecidos na Antiguidade para estas figuras. 6 O círculo era a forma escolhida para trazer luz nas naves centrais das catedrais: a roseta. Porém o aprofundamento dessa harmonia se deu no Renascimento, onde o conflito entre as figuras do quadrado e do círculo esteve mais explícito em projetos arquitetônicos.
Notas:
1. BALTRUSAITIS, Jurgis. Aberrações: ensaio sobre a lenda das formas. RJ. URFJ Editora. 1999. p. 189.
2. PENNICK, Nigel. Geometria Sagrada. SP.Editora Pensamento. 1980. c. 8.
3. Ibid, c. 9.
4. WITTKOWER, Rudolf. Los fundamentos de la arquitectura en la edad del humanismo. Madri, Espanha. Alianza editora. 2002. apêndice IV, p. 214.
5. Isidoro de Sevilha (556 a 636) foi um teólogo agostiniano e bispo espanhol. De origem visigoda, é considerado um dos maiores escritores dos primeiros séculos do Cristianismo. Criou várias escolas e seminários na Espanha. Sua obra mais importante é chamada Etimologiaelibri, uma enciclopédia com 20 volumes, sendo os três primeiros sobre arte, e os demais sobre astronomia, artes militares, etc.. Conhecia a obra de Aristóteles (parte dela utilizou em sua enciclopédia) antes mesmo dos árabes a trazerem, porém o contato com estes possibilitou a coleta de dados para os livros sobre matemática e geometria..
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