quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Homo Religiosus

                                    “Possuidor de um tesouro de signos que tem a faculdade de
                                                multiplicar infinitamente, o homem é capaz de assegurar a retenção
                                               de suas idéias eruditas, comunicá-las para outros homens e
                                               transmití-las para os seus descendentes
                                                                     como uma herança sempre crescente.”   
                                              
                                               Jacques Turgot, em “Plano para dois discursos sobre a história universal”, 1760. 1

                O surgimento do humano se deu através de um processo muito longo. Porém, a postura ereta foi determinante, e graças à capacidade de simbolizar, à criação de ferramentas e a um aprimoramento da linguagem (elementos do que pode se chamar cultura), o homem foi capaz de alcançar um convívio especifico com o meio ambiente.  Estabelecendo vínculos entre os indivíduos do grupo devido à dependência recíproca, criou defesa frente aos predadores muito mais fortes e velozes e, auxiliado principalmente por um sistema de comunicação, conseguiu preservar seus “filhotes” e estabelecer as primeiras comunidades. 2 Sobretudo a capacidade de simbolizar e estabelecer uma cultura possibilitou constituir uma extraordinária característica: pensar no que estava presente, diante dos olhos. E, neste sentido, “o homem sempre buscou explicações para fatos tão cruciais como a vida e a morte.” 3.
                Assim que os seres humanos saíram das cavernas para viver em cabanas, duas direções básicas – agressividade e religião – ditaram as formas da primeira arquitetura.  O homem, que já deixava suas marcas no meio ambiente, passou a perceber a existência de outros grupos, iniciando um período de lutas por melhores lugares que garantiriam a sua subsistência. Naquele momento, sua capacidade de sobrevivência não era apenas ameaçada pelas forças da natureza, mas também pelos conflitos surgidos no seio de uma mesma sociedade ou devido a rivalidades entre sociedades diferentes. Assim se deram as primeiras experiências no que diz respeito à agressividade – defesa.

No que diz respeito à religião, os acontecimentos naturais (como fenômenos climáticos, físicos, orgânicos) para os quais o homem não tinha explicação, eram entendidos como realizados por uma “Força Superior Divina”, a qual ele não conhecia. A necessidade de respostas e o medo levaram o homem a tentar estabelecer uma conexão com essa força divina, elaborando espaços sagrados – desagregados do sítio de uso comunitário – por intermédio de uma simbologia de destaque. E, nesses espaços sagrados, por meio da possível união com o Cósmico, o homem tentou garantir a exclusividade quanto à realização dos seus interesses pessoais.
 Importante ressaltar que a religião é manifestação própria do ser humano. Ela não está presente nos outros seres vivos, mas somente no homem, dando à história da humanidade marcas profundas, e inspirando as produções artística e literária de diversas épocas. Assim, como o homem é considerado sapiens, sociabilis, faber, é também considerado religiosus. O homem continua sendo sapiens, sociabilis e faber, mesmo opondo-se a pensar, viver em sociedade, e trabalhar; da mesma forma a religiosidade é uma constante na raça humana, mesmo que não seja cultivada por todos os indivíduos. 4
Das formas geométricas básicas utilizadas para o destaque desses espaços,  três são as principais, as quais o homem se apropriou para simbolizar sua vontade de conexão com o Cósmico: o círculo,  o quadrado e o triângulo. Cada uma delas é dotada de propriedades únicas e detém um simbolismo esotérico que transcendeu ao longo da história humana. A aplicação universal dos princípios idênticos dessa “geometria sagrada” em lugares separados no tempo, no espaço e por crenças diferentes, atesta essa natureza transcendental. Assim, a geometria sagrada foi aplicada nos templos pagãos do Sol, nos relicários de Isis, nos tabernáculo de Jeová, nos santuários de Marduk, nos santuários erigidos em honra dos santos cristãos, nas mesquitas islâmicas, e nos mausoléus reais e sagrados. 5   Em todos os casos, uma cadeia de princípios constantes – porém adaptáveis – conecta essas estruturas sagradas, comprovando que, conforme disse Confúcio, “a natureza dos homens é a mesma; são seus hábitos que os mantém separados.”
  NOTAS 
Imagem: Pintura rupestre do Pátio Nacional serra da Capivara em São Raimundo Nonato, PI, Brasil.
1. TURGOT, Jacques. Discurso sobre el progreso humano. Barcelona. Editora Tecnos.1999.p. 45
2. GUERRIERO, Silas. Antropos e Psique:o outro e a sua subjetividade. SP. editora Olhos d'água. 2000. c.1.
3. LARAIA. Roque de Barros. Cultura - um conceito antropológico. SP. Editora Jorge Zahar. 2004. p.89.
4. MONDIN, Battista. O homem, quem é ele?.SP. Paullus editora. 2004. p. 224.
5.LARAIA, Roque de Barros. Cultura - um conceito antropológico. SP. Editora Jorge Zahar. 2004. p.10.

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